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QUANDO TERMINA 2013?

02-01-2014
Postado por Milton Marques em Palavrizar

No final de todos os anos, analistas políticos, pesquisadores, videntes, cartomantes, tarólogos e outros tipos de visionários são convidados a oferecer ao público sua versão sobre como será o novo ano e quais deverão ser os eventos e acontecimentos mais importantes.

A Antiguidade inventou o Oráculo de Delfos, e a modernidade, os vários métodos e técnicas de análise prospectiva. Boa parte desses métodos utiliza a experiência pessoal do analista com temas correlatos ou recorre a cenários semelhantes do passado para determinar se haverá ou não a confluência das variáveis capazes de determinar certo evento. Todos o que se metem com o ofício de fazer previsões têm grandes desafios no final de cada ano, e, no final de 2013, um deles será o de prever o desdobramento das eleições presidenciais de 2014. Nesse sentido, é hora também de revisitar os principais fatos e eventos relevantes de 2013 e alguns textos escritos durante o ano no Blog da Innovare.

A Candidatura Dilma.

Parece haver um grande consenso sobre a inevitabilidade de reeleição da presidente Dilma Rousseff. Mesmo os analistas com forte viés oposicionista guardam grandes reservas sobre outras possibilidades, preferindo admitir o favoritismo e apontar outro cenário somente mediante a possibilidade de entrada em cena de algo novo e inesperado.

Com efeito, se analisada a série histórica das pesquisas de intenção de voto, divulgadas em 2013, veremos que de fato existe uma forte tendência em favor da reeleição. É nela que se baseia a grande maioria dos analistas políticos e pesquisadores. Mesmo sofrendo uma forte queda de popularidade, com impacto nas intenções de voto, entre os meses de maio e julho – em parte pelas manifestações de rua -, a candidatura Dilma foi capaz de se recuperar e voltar a apresentar números compatíveis com as pesquisas realizadas no início do ano.

Até agora, nada de novo. Dilma tem a possibilidade objetiva de se reeleger com grande folga, ainda em primeiro turno. Os números mostram não somente a larga vantagem, mas, principalmente, a espantosa capacidade da candidatura Dilma de vencer a eleição em todas as faixas de renda. Ou seja, hoje, pobres e ricos pretendem eleger Dilma. Com a liderança em todas as faixas de renda, a sua estratégia de campanha será inevitavelmente marcada pelo esforço de defender esse patrimônio eleitoral. Visto dessa forma, a campanha de Dilma teria como inimigo o ar rarefeito das alturas dos altos índices de intenção de voto, que parecem obnubilar seus analistas e marketeiros, ao ponto de declarem coisas como: “Vamos esmagar os nanicos, ou a eleição em primeiro turno está garantida.”

Aviso aos mais apressados: todo cuidado é pouco. Durante os mais de dez anos de governo do PT, Lula e Dilma viveram momentos de baixa. Em pelo menos três ocasiões, ambos viram o seu patamar de avaliação positiva cair de forma significativa. Em todos eles, a principal razão foi a percepção do eleitorado sobre noticiário negativo em relação ao governo. Isso pode ser constatado na série histórica de pesquisas do Ibope; vejam que, em setembro de 2005, no final do ano de 2007 e em junho de 2013, o cenário de uma possível reeleição poderia ser diferente. Significa dizer: se o governo deixar se dominar por uma agenda negativa e que tenha forte impacto no noticiário, a probabilidade de vitória folgada, e em primeiro turno, pode não ser mais uma realidade.

 gráfico

A percepção sobre o noticiário negativo, em relação ao governo, foi marcada por escândalos, desempenho negativo na economia e todo tipo de crise política. De 2003 até julho de 2013, encontramos cerca de 190 fatos negativos e com grande repercussão de imprensa, sendo que, nos anos de 2005 e 2006, foram 35; em 2007, foram 20; e, em 2012, outros 20 episódios. Significa dizer que a candidatura do PT é forte, mas não é imune ao estrago gerado pelo noticiário negativo.

Temos duas grandes possibilidades para a ocorrência de um cenário de dificuldades como os do passado. A primeira vem do chamado “fogo amigo”. Como os integrantes do governo, assim como da base aliada, são capazes de gerar escândalos e lambanças políticas, no atacado e no varejo, não seria uma grande surpresa a presença de fatos e acontecimentos que venham a ganhar de forma muito negativa as principais páginas dos jornais, destaque nos noticiários de TV e uma ainda incompreendida, porém importante, audiência na internet e nas redes sociais. No que tange à segunda possibilidade, o governo não parece ter grandes mecanismos de controle – são eles os espontâneos movimentos sociais urbanos. Conhecemos bem o primeiro tipo de possibilidade; o segundo, mesmo que até hoje pouco compreendido, merece uma discussão mais sistemática. Existem reais chances de retorno dos movimentos de protesto nas principais cidades brasileiras.

Recuperemos um pouco os fatos e algumas possíveis interpretações.

“Em maio e junho de 2013, o inesperado aconteceu. O povo das maiores cidades brasileiras foi às ruas. Dia após dia, gritaram palavras de ordem, exibiram cartazes, faixas e pinturas nos rostos. No estoque de protesto uma longa pauta: corrupção, mobilidade urbana, oposição a Propostas de Emendas à Constituição, aumento de preços do transporte coletivo, gastos excessivos nos preparativos para a Copa do Mundo, limitação do direito de ir e vir nas ‘áreas FIFA’, dentre tantas outras”.

A imprensa e os governantes foram tomados de grande surpresa e reagiriam de forma absolutamente inadequada e, na maioria das vezes, de forma antidemocrática.  A primeira tentou caracterizar o movimento como a manifestação de um punhado de gente desocupada, violenta e reivindicando centavos. Os segundos se limitaram, nos primeiros dias, a tratar o assunto com a força policial e com indiferença política. A Presidente Dilma reagiu de forma reativa e letárgica – depois de ver manifestações inadequadas de seu primeiro escalão, foi a público aceitar a legitimidade das manifestações e seu conteúdo.

Ficou evidente que o PT tinha perdido a embocadura.

O afastamento do partido dos movimentos sociais foi sendo estabelecido já nos primeiros anos governo. Inicialmente, pretendia ser o partido dos movimentos sociais.  No entanto, para manter certo nível de estabilidade e governabilidade, o PT foi se transformando em um conjunto de atividades estritamente partidárias. O partido e o governo atuaram de forma sistemática no sentido de desmobilizar os movimentos sociais, aniquilar a sua autonomia, por meio de um programa permanente de cooptação das lideranças sindicais e dos movimentos sociais. As lideranças, assim como parte dos integrantes do partido, foram submetidas ao mundo da pequena política no intuito de construírem uma hegemonia política. Perderam, assim, um de seus traços mais característicos: o de ter surgido diretamente dos movimentos sociais urbanos.

O governo estabeleceu o maior programa de distribuição de renda do país, por meio de um conjunto de políticas públicas contra a miséria e a desigualdade. O partido criou bases eleitorais sólidas nas camadas mais pobres da população, o que lhe garantiu várias vitórias eleitorais. No entanto, o partido e o governo não compreenderam que um bem sucedido, e necessário, programa de distribuição de renda não era suficiente para avançar significativamente nas discussões sobre as desigualdades da sociedade brasileira.

No lulismo, os embates políticos foram adiados ao se cooptarem os sindicalistas, os movimentos sociais e o parlamento: toda possibilidade de embate político passou a ser resolvida na rotina, escandalosa ou não, dos gabinetes e dos ministérios. Ao desmobilizar os movimentos sociais e o novo sindicalismo, o lulismo preferiu a adoção de uma política de compra de certa hegemonia e não governar de frente, de forma positiva, com os antagonismos de uma sociedade complexa como é a brasileira.

Ao evidenciarem um profundo mal-estar com o país, nossos manifestantes olham para um lado e outro, e não encontram lideranças com algum crédito e capazes de assumir a responsabilidade pela condução da discussão política dessa ampla pauta de reivindicações. Nosso modelo de representação política não mais é capaz de atender à agenda política da população brasileira. O PT, assim como o PSDB, em muitos anos de poder não foi capaz de encaminhar as grandes reformas necessárias para o desenvolvimento sustentável do país.

Nada de similar tinha acontecido na história brasileira.

As manifestações levaram a popularidade da presidente para patamares mais baixos, mas não suficientes para mudar abruptamente o cenário eleitoral de 2014. Se por um lado as manifestações indicam um caminho de fragilidade da candidatura Dilma, por outro demonstram que, mesmo diante de intensos protestos contra políticos e governantes, sua candidatura possui cerca de 35% de intenções de votos cristalizados, quase inabaláveis. Não é difícil compreender: somando-se os eleitores identificados com o PT com os eleitores cujas famílias são atendidas por algum programa social do governo, já temos 1/3 do um volume de votos do eleitorado brasileiro. A luta da oposição começa contra uma candidata que tem uma grande largada e sólida base eleitoral.

Segundo a versão governista, o Brasil é um país que poderia festejar as conquistas da última década; no entanto, é um país que protesta. Hoje a principal candidatura para as eleições de 2014 deve temer a possibilidade da eclosão de movimentos reivindicatórios de massa nas principais cidades brasileiras – esse deverá ser um dos seus principais pesadelos.

O fracasso das oposições – o segundo colocado: os votos branco e nulo.

Em virtude do gigantesco sentimento de frustração, poderemos ter, nas eleições de 2014, um volume recorde de votos brancos e nulos. Se somarmos as intenções de voto nulo, branco e “não sabe em quem votar”, teremos 35% dos eleitores. Ou seja, se temos um candidato viável para a disputa de um segundo turno, ele é o branco e nulo.

Diante de um quadro de esgotamento de nossas estruturas de participação política, o cidadão tem tão somente o direito de voto como a única via para se transformar em ator político. Quer dizer, a participação é restrita às disputas eleitorais, em que partidos políticos competem por cargos eletivos. Nos últimos anos, parte expressiva dos eleitores vem demonstrando o desejo de não escolher candidatos, e, pelo que tudo indica, essa tendência deverá ser mantida para a próxima eleição.

Se por um lado os votos branco e nulo revelam uma forma de protesto e inconformismo com a estrutura de representação política brasileira, mostram, por outro, a incapacidade da oposição de estabelecer um discurso e um programa de governo com um mínimo de aderência aos anseios do Brasil que vai para as ruas e protesta.

A Candidatura Aécio Neves – o passado que não quer passar.

Aécio é um político experiente e não quer participar de uma aventura. Conhece bem a lógica da vitória e da derrota eleitoral, segundo a qual é possível ganhar, “perder ganhando” ou “perder perdendo”. Em caso de vitória nas eleições presidenciais de 2014, Aécio Neves e o PSDB terão realizado um grande feito político.

O PSDB, para a campanha de 2014, promete fazer a sua parte. Aécio se tornou o presidente do partido, deverá se consolidar como a principal figura da oposição e ainda terá o apoio de Fernando Henrique Cardoso, que promete percorrer o país fazendo um ciclo de debates e encontros apoiando sua candidatura.

A presidência do partido foi e será importante na medida em que Aécio terá controle sobre a máquina do PSDB. Fundamental para alinhar os governadores, a bancada federal, os prefeitos e os vereadores em torno da sua candidatura. É igualmente importante para neutralizar o risco – não desprezível – de ser atingido por “fogo amigo”. José Serra não deve ter esquecido os resultados das eleições de 2010 em Minas Gerais e a “indiferença” eleitoral de Aécio Neves.

A presença de Fernando Henrique na campanha é uma questão delicada. Nenhum observador atento pode subtrair de FHC a sua importância política, a sua capacidade intelectual, o seu profundo senso democrático e a criação do plano de estabilização da economia brasileira. Méritos não lhe faltam. Porém, eleitoralmente, não é mais um grande “alavancador” de votos. Nas últimas campanhas políticas, ele tem sido mais um problema do que uma solução, pois não empolga e coloca as campanhas do PSDB na defesa de seus dois mandatos, não permitindo que o passado passe. Caberá a Aécio Neves encontrar a dose certa. É impossível fazer uma campanha sem ele, mas colocá-lo em evidência, levando em consideração as experiências eleitorais recentes, pode ser fatal. E tudo o que o PT quer é polarizar a eleição com o PSDB e brigar pelos melhores indicadores e resultados na comparação entre os dos dois períodos de governo.

O PSDB não aprendeu que é inócuo disputar com o PT um mesmo posicionamento. A disputa pelos números e estatísticas que já se encontra há algum tempo, publicamente instaurada, nos debates na imprensa e na internet e redes sociais em nada irá contribuir para a candidatura tucana. Esse é independente de juízos de valor, um confronto desvantajoso para o PSDB. Discutir heranças, sejam elas benditas ou malditas, é se ocupar de um espólio, que pode representar um patrimônio de relevância e discutível aos olhos dos eleitores e até mesmo dos herdeiros. Encapsulado, o PSDB insiste em não deixar o passado passar.

Cabe principalmente ao PSDB a negação de um processo eleitoral que nos remeta para uma escolha entre isso ou aquilo.

Em um cenário de reeleição de Dilma, para se considerar vitorioso e como um candidato com fortes chances para as eleições de 2018, Aécio Neves terá, no mínimo, que disputar um segundo turno e obter votações expressivas em colégios eleitorais onde a sua figura política é pouco expressiva. Nesse cenário, ele teria certa vitória e, mesmo na derrota, continuaria como personagem relevante do sistema político nacional.

Aécio irá disputar a eleição de 2014 não somente contra o PT de Dilma, mas também contra uma chapa formada por Marina Silva e Eduardo Campos. Ainda não se sabe com quem na cabeça da chapa.

Uma pulverização dos votos oposicionistas torna a situação eleitoral de Aécio Neves sensivelmente pior. Não é aceitável, para suas pretensões, ser derrotado em primeiro turno por Dilma ou, o que seria ainda pior, ficar em terceiro lugar nas eleições presidenciais. Esse parece ser um risco real, principalmente se Marina Silva vier na cabeça da chapa.

Como é possível ver, o cenário para a candidatura Aécio não é simples: existe a possibilidade real de “perder perdendo”.

O PSDB e Aécio Neves não dão mostras de que estão perto de encontrar o caminho para vencer as próximas eleições presidenciais. Por enquanto, nada que arrebata e que fale de forma visceral para a alma do eleitor e, muito menos, para o país, que sai para as ruas e protesta. A recente veiculação dos comerciais, no horário eleitoral destinado aos partidos políticos, foi um verdadeiro equívoco do ponto de vista de criação publicitária e, o que ainda pior, inócuo eleitoralmente.

Para o PSDB, só existe uma saída: reeditar de alguma forma a política do café com leite. A candidatura Aécio Neves só é viável se o partido em São Paulo caminhar junto e, de fato, abraçá-lo como o verdadeiro candidato do partido. É simples, até mesmo porque não existe outra solução, é um problema matemático. Mediante a impossibilidade de entrar com relevância em mercados eleitorais de muito baixa renda, como os do nordeste e norte do país, onde a candidatura Dilma promete ser arrasadora, a candidatura Aécio deveria se ocupar de regiões onde o impacto do programa de distribuição de renda não é tão decisivo eleitoralmente.

Por mais improvável ou inimaginável que possa ser, a melhor opção para o PSDB seria lançar uma chapa PO (pura de origem), com José Serra de vice, ou alguém por ele indicado. Parece, à primeira vista, uma impossibilidade, mas poderá ser a única forma de não sofrer uma derrota acachapante e condenar o PSDB a fazer parte do rol dos partidos nanicos.

Para ir para um segundo turno, o partido terá de obter uma consagradora vitória em Minas Gerais, o que é muito provável que aconteça, e, em São Paulo, focar a sua campanha em cidades com certa complexidade urbana, aquelas cidades que protestam e que romperam de certa forma os dilemas básicos de combate à fome e à miséria. Para as pretensões tucanas, seria necessário abrir uma boa frente de votos no Estado de São Paulo. Feito isso, para os Estados do Centro Oeste e do Sul, seria suficiente uma estratégia de conquistar um volume de votos que, no final, representasse um jogo de soma zero entre as três principais candidaturas. Ou seja, sem a participação das forças políticas do PSDB de São Paulo, não existe a menor chance de uma eleição competitiva. E não haverá outro vice-candidato disponível que tenha o potencial eleitoral que passe perto do que têm hoje os tucanos paulistas.

Não creio que o PSDB fará o que é eleitoralmente recomendável: ouvir e compreender em profundidade os eleitores, propor para o Brasil um novo e inovador programa de governo e, sobretudo, ter a ousadia política de propor uma clivagem eleitoral no Brasil e esquecer o oceano de vaidades que dividem o partido.

Eduardo Campos e Marina Silva e/ou Marina Silva e Eduardo Campos.

Surpreendente, muito surpreendente foi a decisão de Marina Silva de se filiar ao PSB, de Eduardo Campos. Talvez tenha sido o lance político menos esperado de 2013. Nem mesmo o mais ousado dos analistas poderia supor uma atitude como essa. Todo o mundo político ficou definitivamente de boca aberta; até mesmo o candidato à presidência pelo PSB parecia não acreditar no que estava acontecendo e, visivelmente perplexo, durante a coletiva de imprensa, alternava momentos de alegria incontida e de confusão mental.

Marina fez a sua escolha e terá de arcar com os custos advindos de sua discutível tomada de posição. Deixou de utilizar a dificuldade de institucionalizar a Rede como partido político como uma oportunidade de denunciar o estreitamento das decisões do sistema judiciário e, principalmente, do sistema político brasileiro. Representante de um emergente, mas muito significativo, movimento social, preferiu não insistir na estratégia de continuar arregimentando forças e aprofundar o discurso de renovação da política e de criticar as estruturas partidárias existentes. Era sabido por todos que a construção de um projeto coletivo dessa dimensão seria algo de difícil realização.

Não quis ser, segundo suas próprias palavras, a “Madre Teresa de Calcutá” e, muito menos, a “Rainha da Internet”. De forma um tanto quanto personalista, deixou que o projeto dos Sonháticos fosse questionado como uma possibilidade de expressão e de importância fundamental para aqueles que apostam no movimento como uma importante ponte para um futuro melhor e possível. A Rede, com sua proposta inovadora de agenda estratégica, tinha grande sucesso na proposição de um debate sobre a sustentabilidade e contra a ideia de progresso e desenvolvimento proposto pelos partidos políticos brasileiros.

Marina não escondeu que a escolha passou pelo fígado e muito pouco por uma análise de médio e longo prazo. Subjacente ao seu discurso esteve sempre presente a referência ao esforço do Palácio do Planalto, que de fato de tudo fez para inviabilizar a aprovação da Rede enquanto partido político. Seguramente, tudo que o PT queria era uma eleição sem Marina Silva, pois o que mais o partido – e o governo – teme é ter que enfrentar algo parecido com que o PT foi um dia foi.

A Rede, com a decisão de Marina Silva, pode perder parte do seu destino desejado: democratizar a democracia e criar um movimento por uma nova política. A escolha foi a de aceitar jogar o jogo da velha política. Não pode ela ser tão ingênua ao ponto de acreditar que sua filiação, mesmo que “democrática”, seja suficiente para que o PSB passe a compartilhar a agenda estratégica e da ética na política proposta pela Rede. Na política real do PSB, Marina Silva terá de enfrentar negociações consideradas como espúrias com outros partidos, com políticos de ficha suja, ou não tão limpa, conservadores e antiambientalistas. O PSB fará alianças e acordos com o mesmo padrão de conduta dos partidos tradicionais.

A Rede, com a filiação de Marina ao PSB, perde parte da boa condição que tinha de representar as “vozes das ruas”.

Mesmo com os seus 22% de intenções de voto nas pesquisas, ela não terá o menor controle sobre as decisões políticas do partido e, com o passar do tempo, tende a não ser tão respeitada como agora. Como já estamos cansados de saber, os 22% de intenção de votos em Marina Silva não migram em conjunto para a candidatura de Eduardo Campos. Foi o que de fato aconteceu nesses últimos meses do ano: a filiação de Marina serviu tão somente para que a candidatura Eduardo Campos deixasse a esfera dos candidatos nanicos.

Marina é acusada por seus pares de cometer “sincericídio” e é uma liderança política difícil de administrar. Então, qual será a sua reação ao ver que o PSB tem como meta eleger a todo custo mais de 50 deputados federais, buscar a qualquer preço aumentar o seu tempo de TV e cooptar, sem muito rigor ideológico, puxadores de votos no Nordeste? Marina terá que adquirir uma habilidade e uma “tolerância” política que não conseguiu em muitos anos de vida pública – se a tivesse, não teria saído do cargo de Ministra do governo Lula e, muito menos, do PT. Por ser completamente artificial, a aliança não suportará a realidade cotidiana de uma campanha eleitoral.

O que não faltará na chapa Eduardo Campos e Marina Silva – ou Marina Silva e Eduardo Campos – são contradições internas. Nem Eduardo Campos sabe se ele é oposição ou base de apoio político ao lulismo.

A aliança entre a ex-senadora e o governador de Pernambuco coloca pressão na disputa entre PT, PSDB e PSB por aliados para a eleição presidencial do próximo ano. O resultado prático será a elevação do preço a ser pago pelos apoios. Dilma deve usar a reforma ministerial para acertar as alianças, enquanto Aécio Neves buscará o apoio dos pequenos partidos e alguns deles rejeitados por Marina Silva.

Por outro lado, o PSDB, que anteriormente tinha sido escolhido, pelo PT, como partido principal para estabelecer uma polarização, ganha algum refresco para repensar a sua estratégia e tentar decolar a candidatura de Aécio Neves. Com o aparente fortalecimento de Campos e Marina, o PT passa a ser obrigado a pensar em uma disputa que tem outro interlocutor relevante.

2013 – o ano que não acabou.

O PT, por ocasião da comemoração de seus dez anos de governo, antecipou a eleição de 2014. Na ótica de seus líderes, o restante do ano de 2013 era um tempo para fazer “cera”; com a certeza de que o jogo já estava ganho, a estratégia era gastar o tempo jogando a bola para as laterais e colocar os adversários na “roda”. Desde o início de seu governo, Dilma não tinha experimentado meses de movimentação política tão intensa e, muito menos, a força dos movimentos sociais urbanos. Mesmo com poucas vitórias e momentos de muita pressão, conseguiu manter o favoritismo para as eleições de 2014. No entanto, a certeza inabalável de uma vitória fácil, e em primeiro turno, foi abalada pela inesperada conjuntura dos acontecimentos de 2013. A reeleição não será tão fácil como acreditavam, e as fragilidades da candidatura e do governo foram reveladas.

O ano de 2013 não terá passado quando ouvirmos os fogos anunciando os últimos minutos de dezembro. Será lembrado em todos os dias de 2014, como um ano especial para a nação brasileira – nele foram julgados, condenados e presos altos dirigentes de importantes partidos políticos -, como o ano em que presenciamos o maior espetáculo de cidadania e busca por participação política na sociedade brasileira, como um ano em que a economia mostrou fortes vulnerabilidades e que anuncia para 2014 a certeza de que o quadro virtuoso de crescimento econômico sem gargalos chegou ao seu limite.

Por tudo isso, só se pode ter uma certeza: o ano de 2014 será intenso politicamente e pode reservar grandes surpresas.

Em 2014, “viver será perigoso”!

Milton Marques, consultor da Innovare Pesquisa para projetos de opinião pública, é autor desse texto, exclusivo para o Blog da Innovare.

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